Os Dez Anõezinhos da Tia Verde-Água, de Teófilo Braga

 

Fonte:

Projeto Vercial <http://web.ipn.pt/literatura//>

 

Permitido o uso apenas para fins educacionais.

 

Este material pode ser redistribuído livremente, desde que não seja alterado, e que as informações acima sejam mantidas. Para maiores informações, escreva para <bibvirt@futuro.usp.br>.

 

Estamos em busca de patrocinadores e voluntários para nos ajudar a manter este projeto. Se você quer ajudar de alguma forma, mande um e-mail para <parceiros@futuro.usp.br> ou <voluntario@futuro.usp.br>.

 

 

 

OS DEZ ANÕEZINHOS DA TIA VERDE-ÁGUA

Teófilo Braga

 

 

Era uma mulher casada, mas que se dava muito mal com o marido, porque não trabalhava nem tinha ordem no governo da casa; começava uma coisa e logo passava para outra, tudo ficava em meio, de sorte que quando o marido vinha para casa nem tinha o jantar feito, e à noite nem água para os pés nem a cama arranjada. As coisas foram assim, até que o homem lhe pôs as mãos e ia-a tosando, e ela a passar muito má vida. A mulher andava triste por o homem lhe bater, e tinha uma vizinha a quem se foi queixar, a qual era velha e se dizia que as fados a ajudavam. Chamavam-lhe a Tia Verde-Água:

 

– Ai, Tia! vocemecê é que me podia valer nesta aflição.

 

– Pois sim, filha; eu tenho dez anõezinhos muito arranjadores, e mando-tos para tua casa para te ajudarem.

 

E a velha começou a explicar-lhe o que devia fazer para que os dez anõezinhos a ajudassem; que quando pela manha se levantasse fizesse logo a cama, em seguida acendesse o lume, depois enchesse o cântaro de água, varresse a casa, aponteasse a roupa, e no intervalo em que cozinhasse o jantar fosse dobando as suas meadas, até o marido chegar. Foi-lhe assim indicando o que havia de fazer, que em tudo isto seria ajudada sem ela o sentir pelos dez anõezinhos. A mulher assim o fez, e se bem o fez melhor lhe saiu. logo à boca da noite foi a casa da Tia Verde-Água agradecer-lhe o ter-lhe mandado os dez anõezinhos, que ela não viu nem sentiu, mas porque o trabalho correu-lhe como por encanto. Foram-se assim passando as coisas, e o marido estava pasmado por ver a mulher tornar-se tão arranjadeira e limposa; ao fim de oito dias ele não se teve que não lhe dissesse como ela estava outra mulher, e que assim viveriam como Deus com os anjos. A mulher contente por se ver agora feliz, e mesmo porque a féria chegava para mais, vai a casa da Tia Verde-Água agradecer-lhe o favor que lhe fez:

 

– Ai, minha Tia, os seus dez anõezinhos fizeram-me um servição; trago agora tudo arranjado, e o meu homem anda muito meu amigo. O que lhe eu pedia agora é que mos deixasse lá ficar.

 

A velha respondeu-lhe:

 

– Deixo, deixo. Pois tu ainda não viste os dez anõezinhos?

 

– Ainda não; o que eu queria era vê-los.

 

– Não sejas tola; se tu queres vê-los olha para as tuas mãos, e os teus dedos é que soo os dez anõezinhos.

 

A mulher compreendeu a causa, e foi para casa satisfeita consigo por saber como é que se faz luzir o trabalho.

 

 

FIM